PADRE GABRIELE AMORTH
Famoso Exorcista da diocese de Roma.
AS PRIMEIRAS BÊNÇÃOS
Convém empregar uma linguagem eufêmica com este tipo de pacientes. Aos exorcismos chamo sempre bênção; às presenças do Maligno, uma vez estabelecidas, chamo negatividades.
O fato das orações serem em latim constitui uma vantagem, porque não se deve utilizar uma linguagem alarmista que poderia ser contraproducente, criando sugestões enganadoras. Algumas pessoas têm a mania que têm o demônio; quase que podemos estar certos que não têm nada. Para o seu espírito confuso, o fato de ser exorcizado, pode tornar-se a prova segura de que têm um demônio; então já ninguém vai ser capaz de lhe arrancar esta idéia da cabeça.
Quando eu ainda não conheço bem as pessoas, insisto em dizer que dou uma benção, mesmo que faça um exorcismo; muitas vezes, dou apenas a bênção do Ritual para os doentes.
O Sacramental completo compreende longas orações de introdução seguidas de três verdadeiros e específicos exorcismos: são diferentes, complementares e seguem uma sucessão lógica até à libertação. Pouco me importa a época em que foram estabelecidos (1614); eles são, indubitavelmente, fruto duma experiência direta muito longa.
Aqueles que as redigiram, experimentaram-nas bem, avaliando as repercussões que cada frase exercia sobre as pessoas endemoninhadas. Ressalve-se, no entanto, algumas pequenas lacunas que o Pe. Cândido se apressou a preencher; e eu com ele. Falta por exemplo uma invocação mariana. Nós juntamo-la em cada um dos três exorcismos, servindo-nos das palavras usadas no exorcismo de Leão XIII; mas trata-se apenas de pormenores uma vez que já vêm pelo menos do séc. IX ou X.
Já disse que o exorcismo pode durar poucos minutos ou várias horas. Quando se exorciza uma pessoa pela primeira vez, mesmo que seja notório desde o início que ela apresenta negatividades, é melhor ser-se breve: uma oração de introdução e um dos três exorcismos; eu escolho geralmente o primeiro que dá também a oportunidade de ministrar a Santa-Unção.
O Ritual não fala disso, como não fala de muitas outras coisas que nós mencionaremos, mas a experiência ensinou-os (inspirando-nos na unção que se faz no Rito do Batismo), que é muito eficaz o uso do óleo dos catecúmenos, pronunciando estas palavras: “Sit nominis tui signo famulus tuus munitus”.
O demônio tenta esconder-se, não ser descoberto, para evitar ser expulso. Por isso pode acontecer que nas primeiras vezes, manifeste muito pouco ou nada a sua presença. Mas depois, com a continuação, a força dos exorcismos obriga-o a pôr-se a descoberto. Existem diferentes meios de provocar, a unção é um deles.
O Ritual não especifica a posição que o exorcista deve adotar: alguns ficam de pé, outras à sua esquerda ou então, atrás. O Ritual preconiza simplesmente que, a partir da frase:”Ecce crucem Domini” o sacerdote deve colocar uma parte da estola no pescoço do paciente e colocar a mão direita sobre a sua cabeça.
Observamos que o demônio é extremamente sensível aos estímulos dos 5 sentidos (“é por aí que eu entro” disse-me um uma vez) e, sobretudo pelos olhos. Por isso, o Pe. Cândido, os seus alunos e eu, temos o hábito de colocar dois dedos levemente sobre os olhos da pessoa e levantar as pálpebras em determinados momentos da oração.
No caso de presença maléfica, os olhos quase sempre estão completamente revirados; distingue-se, logo; às vezes, é necessária a ajuda da outra mão para saber para que lado estão as pupilas: se para cima se para baixo.
A posição das pupilas é significativa no que se refere ao gênero de demônios, e aos distúrbios com que se é confrontado. Em muitos interrogatórios os demônios são classificados segundo uma dupla divisão inspirada no capítulo 9 do Apocalipse: se as pupilas estão para cima, trata-se de escorpiões, se estão para baixo, trata-se de serpentes.
Os escorpiões têm por chefe lúcifer (nome extra-bíblico, mas profundamente enraizado na tradição), e as serpentes têm por chefe satanás que dá ordens também a lúcifer (contudo poderia ser o mesmo demônio) e a todos os demônios. Gostaria de frisar que na Bíblia a palavra “diabo” não tem um sentido genérico como demônio, mas indica sempre e só satanás; o outro nome de satanás é belzebu. Para muitos, lúcifer é sinônimo de satanás. Não aprofundei a questão. Segundo a minha experiência pessoal, trata-se de dois demônios diferentes.
Os demônios não gostam muito de falar: é preciso forçá-los e só falam nos casos mais graves, isto é, naqueles de verdadeira possessão. Por vezes mostram-se espontâneos muito palradores: é um truque destinado a distrair o exorcista para o impedir de conseguir a concentração necessária e também para não responderem às perguntas necessárias quando são interrogados.
Na altura do interrogatório é muito importante restringir-se às regras do Ritual: não fazer perguntas inúteis ou de simples curiosidade, mas perguntar o nome, se há outros demônios e, em caso afirmativo: quantos, quando e como é que o Maligno entrou nesse corpo e quando é que sairá. Se a presença do demônio tem origem num malefício, pergunta-se em que moldes é que esse malefício foi feito. Se a pessoa comeu ou bebeu substâncias maléficas, deve vomitá-las. Se algum bruxedo foi escondido, é preciso fazê-lo dizer onde se encontra para o queimar, tomando as devidas precauções.
Durante o desenrolar dos exorcismos se existe uma presença maléfica, umas vezes manifesta-se aos poucos outras, em explosões bruscas. O exorcista vai avaliando a força e a gravidade do mal: se se trata de uma possessão, de uma vexação ou de uma obsessão; se o mal é de fraca amplitude ou está profundamente enraizado.
É difícil encontrar os textos que forneçam explicações claras acerca desta matéria. Pessoalmente utilizo o seguinte critério: se uma pessoa, no decorrer dos exorcismos (note-se que é este o momento em que o demônio é mais forçado a sair a descoberto, constrangido pela força do exorcismo; embora possa também atacar a pessoa noutras ocasiões mas, geralmente, de modo menos grave); dizia eu, se a pessoa entra completamente em transe, de modo que, quando fala, é o demônio que se exprime através da boca dela, se quando ela se debate é o demônio que se serve dos seus membros e no fim do exorcismo, ela não se lembra de nada do que aconteceu, então trata-se de uma possessão diabólica, isto é, a pessoa alberga um demônio que age de vez em quando com os membros dela.
Por outro lado, se um indivíduo durante os exorcismos apresenta certas reações que revelam um ataque demoníaco, não perde completamente o conhecimento e no fim se lembra, mesmo que seja vagamente, do que fez ou ouviu, trata-se então de uma vexação diabólica: não é um diabo que se estabeleceu de forma permanente dentro do corpo da pessoa, mas é um diabo que de tempos a tempos a assalta e provoca nela distúrbios físicos e psíquicos. No entanto, as coisas nem sempre se passam assim.
Não me alongarei sobre a terceira forma (além da possessão e da vexação) que é a obsessão diabólica, que se manifesta por pensamentos obsessivos, invencíveis, que atormentam, sobretudo durante a noite, mas muitas vezes atormentam também de forma permanente. Tenhamos em conta que o tratamento é o mesmo em todos os casos: oração, sacramentos, jejum, vida cristã, caridade e exorcismos.
Prefiro mencionar alguns distúrbios de caráter geral que possam ser indício de uma causa maléfica, mesmo que não seja sempre esse o caso: não são suficientes para determinar um diagnóstico, mas podem ajudar a formulá-lo.
As negatividades, isto é, os demônios, têm tendência a atacar o homem em cinco pontos, de modo mais ou menos grave, segundo a gravidade da causa: ao nível da saúde, da vida afetiva, dos negócios, do gosto de viver e do desejo de morrer.
Ao nível da saúde:
O maligno tem o poder de causar distúrbios físicos e psíquicos. Já fiz alusão aos dois mil males mais vulgares que afetam a cabeça e o estômago. Trata-se geralmente de males estáveis. Outros são passageiros e muitas vezes só se manifestam durante o exorcismo (arrotos, arremessos, convulsões...).
O Ritual sugere fazer o sinal da cruz sobre ele e aspergi-los com água benta; pude também verificar muitas vezes a eficácia de os cobrir simplesmente com a estola e impor as mãos. Já recebi muitas vezes mulheres aflitas com a idéia de em breve serem operadas de cistos nos ovários: pelo menos era o diagnóstico preconizado em vista das dores e das ecografias.
Depois da benção as dores cessavam; uma nova ecografia já não revelava nenhum cisto e não se falava mais em operação. Ao Pe. Cândido surgiram-lhe pessoas com doenças graves que desapareceram depois das suas bênçãos, até tumores na cabeça, cuja existência já tinha sido confirmada pelos médicos.
Evidentemente que isto só acontece a pessoas que têm negatividades e em relação às quais há razões para se suspeitar que o mal proviesse do Maligno.
Ao nível da vida afetiva:
O Maligno pode provocar um estado de irritação incontrolável, sobretudo contra as pessoas a quem mais se ama. Assim, ele desfaz casamentos, rompe noivados, provoca discussões acompanhadas de urros e gritaria no seio de famílias em que realmente todos se querem bem uns aos outros; e isto sempre por motivos fúteis.
Ele destrói as amizades; dá a impressão, à pessoa visada, de já não ser bem aceite em parte nenhuma, que as pessoas a evitam e que deve isolar-se de toda a gente. Incompreensão, ausência do amor, completo vazio afetivo; impossibilidade de se casar.
O caso seguinte é também extremamente freqüente: cada vez que se inicia uma relação de amizade susceptível de se transformar num caso amoroso, ou mesmo quando alguém se declarou abertamente, tudo desaparece bruscamente como o fumo, sem razão alguma.
Ao nível dos negócios:
Impossibilidade de encontrar trabalho, mesmo quando se tem quase a certeza de ter vaga, não encontram motivos ou são absurdos; ou então, as pessoas que encontram efetivamente um trabalho, abandonam-no em seguida por razões estúpidas, e, quando lhes surge outra oportunidade, não comparecem ou deixam igualmente esse emprego com uma facilidade que parece aos familiares uma inconsciência ou anormalidade.
Conheci famílias abastadas que caíram na maior miséria por motivos humanamente inexplicáveis. Foi o caso, por exemplo de importantes industriais, cujos negócios começaram súbita e inexplicavelmente a andar à deriva; ou então, grandes empresários que, de repente, começaram a fazer erros crassos que lhes causaram um montão de dívidas; ou ainda comerciantes que geriam armazéns muito afreguesados, que sem mais nem menos, começaram a ver as suas lojas desertas.
Em resumo, foram casos que aconteceram relacionados com a impossibilidade de encontrar qualquer espécie de trabalho ou com o fato de passar de uma situação econômica normal para uma situação de miséria, dum trabalho intenso à inatividade. E sempre sem razões válidas.
Ao nível do gosto de viver:
Parece lógico que os problemas físicos, o isolamento afetivo e as dificuldades econômicas originem um tal pessimismo que não se consegue ver senão o lado negativo da vida. Subvém, então, uma espécie de incapacidade para o otimismo ou pelo menos, para a esperança; a vida parece completamente negra, sem possibilidade de se fazerem projetos, insuportável.
Ao nível do desejo de morrer:
É o objetivo final do Maligno: conduzir ao desespero e ao suicídio. E devo especificar que, quando alguém se põe sob a proteção da Igreja mesmo por uma única bênção, este ponto é eliminado. A pessoa tem a impressão de reviver o que o Senhor disse ao demônio a propósito de Job: “Pois que seja! Disse Javé a satanás, podes dispor dele, mas contudo respeita a sua vida” (Job 2,6). Poderia contar uma série de episódios em que o Senhor salvou algumas pessoas do suicídio, por intervenção miraculosa.
São muitas as pessoas que, quando eu exponho estes cinco pontos, se sentem muito tocadas, embora haja graus de gravidade diferentes. Não me cansarei de repetir que estes casos podem resultar duma presença maléfica, mas também podem ter outras causas; por si só não são suficientes para concluir que uma pessoa está infestada ou possessa do Maligno.
Sobre o quinto ponto, o desejo de morrer e tentativa de suicídio, uma vez que é o aspecto mais grave, gostaria de citar pelo menos dois exemplos.
Ocupei-me do caso de uma enfermeira diplomada que, em fase de crise aguda e já não agüentando mais, fez um raciocínio completamente incorreto. Devendo praticar uma transfusão, pensou: “Eu injeto um outro grupo sanguíneo: o doente morre, vou presa e assim refugio-me na prisão”. Pôs o seu projeto em prática, completamente segura de ter utilizado um outro grupo sanguíneo para a transfusão. Depois, refugiou-se no seu quarto e esperou que a viessem prender. Mas as horas foram passando e nada. A transfusão desenrolou-se muito bem (ignora-se como), e a enfermeira já não pensava em mais nada senão em se arrepender da sua estupidez.
João Carlos, um belo jovem de 25 anos, parecia cheio de vida e em perfeita saúde. Entretanto tinha um “hospede” que o atormentava horrivelmente. Os exorcismos proporcionavam-lhe um pouco de alívio, mas não o suficiente. Uma noite tentou pôr fim à vida como já tinha tentado fazer outras vezes.
Caminhou ao longo das linhas duma importante estação de caminho de ferro, e quando chegou a uma curva larga, estendeu-se atravessando sobre os carris de uma das duas linhas. Conseguiu manter-se nesta posição insuportável durante 4 ou 5 horas porque se meteu num saco-cama de pelo. Passaram vários comboios nos dois sentidos mas todos na outra linha. E nenhum maquinista ou ferroviário se apercebeu da sua presença. Isto aconteceu; é-me impossível dar uma explicação natural.
Perguntei ao Pe. Cândido se, no decurso da sua longa experiência, algumas pessoas a quem ele tinha dado a bênção tinham falecido. Disse-me não ter reconhecimento senão dum único caso que me relatou. Uma jovem de Roma, já reduzida a um estado lamentável por causa de uma possessão completa da parte do Maligno, tinha começado a visitá-lo para ser exorcizada. Embora registrasse umas certas melhoras, tinha sempre muita dificuldade em resistir a tentação do suicídio.
A mãe um dia foi visitar o Pe. Cândido: esta mulher acreditava que a filha estava obcecada e dirigia-lhe constantemente acusações. Ela ouvia as explicações do Pe. Cândido, parecia convencida mas, na realidade, não estava nada. Um dia, quando a filha lhe falava acerca das suas contínuas tentações de se suicidar, esta mãe indigna fez-lhe uma das suas cenas habituais: Tu és uma obcecada, não fazes nada de jeito nem sequer te sabes matar.
Tenta então a ver se és capaz! E ao dizer estas palavras abriu a janela de par em par. A jovem atirou-se e morreu com a pancada. Este é o único caso de suicídio que o Pe. Cândido tem a lamentar com um dos seus pacientes. Mas é mais que evidente a culpa da mãe, que já tinha culpas anteriores pelo estado em que a filha se encontrava.
Antes falamos da duração dos exorcismos e da impossibilidade de prever o tempo necessário a obtenção da libertação. A colaboração ativa da pessoa é essencial mas, por vezes, apesar disso, só se obtêm melhoras e não cura. O Pe. Cândido um dia estava a exorcizar um rapaz grande e forte, daqueles que fazem suar um exorcista porque requerem também um enorme esforço físico. Por vezes tem-se a impressão de travar uma luta a valer.
Desde o início a adolescente tinha dito ao Pe.: não sei se é boa idéia exorcizar-me hoje, tenho a impressão de que o vou magoar. Com efeito, travou-se um verdadeiro combate, sem que se pudesse prever quem iria vencer. Depois, de repente, o jovem caiu seguido pouco depois pelo Pe. Cândido que caiu por cima dele. Disse-me sorrindo: Se alguém tivesse entrado naquele momento não teria percebido qual de nós os dois é que era o exorcista ou o possesso.
O padre recompôs-se e pôs termo ao exorcismo. Alguns dias depois o Pe. Pio mandou-lhe dizer: Não desperdice o seu tempo e as suas forças com esse rapaz. É trabalho perdido. Graças a sua intuição que vinha do alto. O Pe. Pio compreendeu que não se poderia conseguir nada neste caso. E os fatos confirmaram as suas palavras.
Gostaria de chamar a atenção para o seguinte: a possessão diabólica não é um mal contagioso, nem para a família, nem para os que assistem, nem para os lugares onde os exorcismos são praticados. É importante sublinhar isto porque nós, os exorcistas, deparamo-nos muitas vezes com dificuldades quando precisamos de encontrar locais onde possamos administrar este sacramental.
E grande número de recusas derivam precisamente deste medo que o local fique infestado. É necessário que os padres saibam que a presença dos possessos e os exorcismos realizados sobre uma pessoa não deixam a menor conseqüência nos locais nem nas pessoas que os habitam. Pelo contrário é o pecado que devemos recear; um pecador endurecido, um blasfemador pode destruir a sua família, o ambiente de trabalho e os locais que freqüenta.
Vou agora relatar vários casos que não figuram entre os acontecimentos mais espetaculares que sucederam comigo, mas entre os típicos mais comuns.
1- Uma adolescente de 16 anos, Ana Maria estava inquieta porque já há algum tempo que estava a falhar nos seus estudos (contudo antes nunca tinha encontrado nenhuma dificuldade) e em casa ouvia barulhos estranhos. Veio procurar-me acompanhada dos pais e da irmã. Dei-lhe a benção e notei um pequeno sinal de negatividade. Enquanto eu colocava as mãos na sua cabeça, ela emitiu um grande urro e deslizou da cadeira onde estava sentada para o chão.
Mandei sair as duas irmãs e continuei o exorcismo, ficando o pai a assistir; notei uma negatividade ainda muito maior nela do que na filha. Para Ana Maria foram suficientes três bênçãos; era um caso ligeiro e foi imediatamente resolvido. Quanto a mãe, durou vários meses, ao ritmo de uma benção por semana, e ficou completamente curada e bem mais depressa do que deixavam prever as reações manifestadas durante a primeira benção.
2- Joana, uma senhora com cerca de 30 anos, mãe de 3 filhos, foi-me enviada pelo seu confessor. Sofria de dores de cabeça, de estomago e de desmaios. Segundo os médicos ela estava de perfeita saúde. O mal foi-se embora pouco a pouco; era devido a presença de três demônios, cada um tendo penetrado nela respectivamente após três malefícios feitos em três etapas diferentes da sua existência.
O malefício mais forte tinha-lhe sido feito por uma jovem que, antes do casamento da Joana, desejava profundamente casar com o noivo dela. Joana fazia parte de uma família de intensa oração, o que facilitou os exorcismos; dois demônios saíram rapidamente, no entanto, o terceiro resistiu mais. Foram precisos quase três anos de bênçãos ao ritmo de uma por semana.
3- Recebi um dia a visita de Marcela, uma jovem muito loura de 19 anos, com um ar descarado. Sofria de dores lancinantes no estômago e tinha um comportamento que não conseguia dominar nem em casa, nem no trabalho: dava respostas ofensivas, ásperas, sem se conseguir segurar. Para os médicos ela não tinha nada.
Quando lhe pus as mãos sobre as pálpebras, no início da benção, ficou com os olhos totalmente revirados, com as pupilas apenas visíveis viradas para baixo, e deu uma gargalhada irônica. Só tive tempo de pensar que se tratava de satanás, quando ouvi dizer: sou satanás! Voltando a dar uma gargalhada. Marcela intensificou progressivamente a sua vida de oração, comungou com constância, rezou diariamente o terço e confessou-se todas as semanas (a confissão é muito mais forte que um exorcismo).
O seu estado melhorou progressivamente, excetuando algumas pequenas recaídas que se verificaram quando diminuía um pouco o seu ritmo de oração; curou-se ao fim de dois anos.
4- José, 28 anos foi visitar-me com a mãe e a irmã. Percebi logo que só tinha vindo para fazer a vontade aos seus familiares. Cheirava a tabaco que empestava; drogava-se, passava droga e blasfemava. Inútil falar de oração e de sacramentos! Esforcei-me por levá-lo a aceitar a minha benção de boa vontade.
Mas passados breves momentos, o demônio manifestou-se imediatamente com violência e eu não insisti. Quando eu disse ao José o que é que ele tinha, respondeu-me: Já sabia e estou contente assim; sinto-me bem com o demônio.
Não o voltei a ver.
5- Quando a irmã Ângela me veio visitar, ainda era muito jovem, mas já se encontrava num estado deplorável: já quase não conseguia falar e muito menos rezar. Sofria manifestamente em todo o seu corpo, não havia uma única parte que não demonstrasse sofrimento. As blasfêmias não paravam de lhe acudir a cabeça e ouvia muitas vezes ruídos estranhos que as outras religiosas também sentiam.
A maldição (e por certo a bruxaria) dum padre indigno, estava na origem de todos estes problemas; a Irmã Ângela oferecia cada um dos seus sofrimentos pela sua congregação. Depois de inúmeras bênçãos, que lhe trouxeram um certo alívio, foi transferida para uma outra cidade. Espero que ela tenha encontrado um outro exorcista para prosseguir esta obra de libertação.
6- Entre os casos horríveis de malefícios feitos a uma família inteira, vou relatar um.
O pai, comerciante até ali, cheio de êxito, deixou subitamente de receber encomendas por razoes inexplicáveis. Os armazéns estavam cheios de mercadorias, mas os clientes tinham desaparecido. Uma vez conseguiu colocar um certo número dos seus produtos mas o caminhão encarregado de retirar a mercadoria sofreu várias avarias sem conseguir chegar ao destino, o que ocasionou que o contrato fosse anulado.
Outra ocasião depois de ter tido imensa dificuldade em concluir uma venda, o caminhão chegou mas ninguém foi capaz de abrir o portão de ferro do armazém: este negócio também se esfumou.
Na mesma altura, uma das suas filhas, casada, foi abandonada pelo marido; o noivo da outra filha, nas vésperas do casamento, quando os preparativos de casa estavam terminados, deixou-a sem dar qualquer explicação. Não falando dos problemas de saúde e dos barulhos que se ouviam na casa, como acontece quase sempre em casos semelhantes.
Parecia não se saber por onde começar. Além das recomendações habituais referentes a oração, a freqüência dos sacramentos e a uma vida cristã vivida de forma coerente, comecei também a abençoar todos os membros da família. Em seguida exorcizei e celebrei missa na casa e nos locais de trabalho do pai. Os efeitos começaram a manifestar-se ao fim de um ano, e continuaram gradualmente, embora devagar. Que provas duras para a fé e a perseverança!
7- Antônia, 20 anos, veio ter comigo acompanhada pelo pai, pasteleiro. Mais ou menos ao mesmo tempo em que a jovem tinha assumido o aspecto duma vidente (ouvia vozes estranhas, não conseguia dormir nem trabalhar) o pai começou a sofrer de dores de estômago que tanto os médicos como os medicamentos se mostravam incapazes de acalmar.
Quando dei benção a filha, vi que se tratava de uma ligeira negatividade; disse-lhe que, em princípio, algumas bênçãos seriam suficientes para a cura. Ao contrário, quando dei a benção ao pai, este entrou em transe, ficando completamente mudo e sem manifestar a mais pequena agitação. Por outro lado percebi que ele não tinha dado conta de nada. Recomendei a filha que não dissesse nada ao pai do que se tinha passado para não o assustar, mas que voltassem os dois.
Ao voltar a casa, ela não foi capaz de se calar e contou tudo; o pai, apavorado com a idéia de ter entrado em transe, foi procurar um bruxo. Sei pela pessoa que os mandou vir ter comigo que os dois estão mal mas nunca mais me procuraram.
Não são os únicos a agir desta forma; soube de outras pessoas que, desencorajadas pela lentidão da cura, se voltaram para bruxos, mas com péssimas conseqüências. Deus criou-nos livres. Somos igualmente livres de nos destruirmos.
Concluindo este capítulo, tenho que precisar um fato: cada exorcista tem a sua experiência que por vezes é irrepetível, e pode acontecer que não tenham tido conhecimento do que tivesse acontecido a outros exorcistas.
Não me custa a crer que alguns exorcistas tenham ficado admirados, sobretudo com o que expus na primeira parte: acerca da posição dos olhos, das dores de cabeça ou de estomago; poderia ter reportado outros fatos que me acontecem constantemente. São reações para as quais sempre ou quase sempre o Pe. Cândido me alertou e que continuam a repetir-se com os seus alunos. São verdadeiras, mesmo que não tenham sido experimentadas por outros exorcistas.
Penso que se deve ter em conta, com muito respeito os diversos métodos e as diversas experiências. Não fica diminuída a verdade de um fato, ou de um tipo de reação, ou a eficácia de um método, ainda que se trate de uma particularidade legada a um determinado exorcista e não verificada por outros.
Fonte: Extraído do Livro "Um Exorcista Conta-nos" - Pe. Gabriele Amorth - Ed. Paulinas.