PAPA BENTO XVI:
EVITAR SECULARIZAÇÃO DOS SACERDOTES
E CLERICALIZAÇÃO DOS LEIGOS
17.09.09: Castel Gandolfo,– O Papa Bento XVI recebeu hoje em audiência, na residência apostólica de Castel Gandolfo, 22 bispos do Regional Nordeste 2 da CNBB, que compreendem as províncias eclesiásticas de Olinda e Recife, Paraíba, Maceió e Natal, que concluem amanhã sua visita ad Limina.
O discurso de Bento XVI foi centralizado no papel específico dos sacerdotes e dos leigos na comunidade eclesial. O papa recordou que a Igreja é organicamente estruturada como Corpo de Cristo; portanto, os membros não têm todos a mesma função: "É isto que constitui a beleza e a vida do corpo".
Nessa perspectiva, afirmou o pontífice, é necessário evitar a secularização dos sacerdotes e a clericalização dos leigos, explicando a função específica de cada um:
"Os fiéis leigos devem empenhar-se em exprimir na realidade, inclusive através do empenho político, a visão antropológica cristã e a doutrina social da Igreja. Diversamente, os sacerdotes devem permanecer afastados de um engajamento pessoal na política, a fim de favorecerem a unidade e a comunhão de todos os fiéis e, assim, poderem ser uma referência para todos".
Para o papa, a relação entre sacerdócio comum e ministerial constitui atualmente um dos pontos mais delicados do ser e da vida da Igreja. A falta de presbíteros, afirmou, não justifica uma participação mais ativa e numerosa dos leigos. "Na realidade, quanto mais os fiéis se tornam conscientes das suas responsabilidades na Igreja, tanto mais sobressaem a identidade específica e o papel insubstituível do sacerdote como pastor do conjunto da comunidade, como testemunha da autenticidade da fé e dispensador, em nome de Cristo-Cabeça, dos mistérios da salvação."
Assim, acrescentou Bento XVI, a função do presbítero é essencial e insubstituível para o anúncio da Palavra e a celebração dos Sacramentos, sobretudo da Eucaristia: "Por isso, urge pedir ao Senhor que envie operários à sua Messe; além disso, é preciso que os sacerdotes manifestem a alegria da fidelidade à própria identidade com o entusiasmo da missão".
O papa disse aos bispos que a carência de presbíteros não pode ser considerada normal ou típica do futuro, mas eles devem se esforçar para despertar novas vocações sacerdotais e encontrar os pastores indispensáveis às dioceses. Àqueles já ordenados, devem viver com coerência e em plenitude a graça e os compromissos do batismo.
Mais uma vez, neste período em que a Igreja celebra o Ano Sacerdotal, Bento XVI propôs o Santo Cura d'Ars e Frei Galvão como modelos para os presbíteros, pois ambos procuraram imitar Jesus Cristo, fazendo-se não só sacerdote, mas também vítima e oblação como Jesus.
E concluiu: "Que a bem-aventurada Virgem Maria interceda por todo o povo de Deus no Brasil, para que pastores e fiéis possam, com coragem e alegria, 'anunciar abertamente o mistério do Evangelho'".
Fonte: Rádio Vaticano.
S. S. o Papa Bento XVI.
Castel Gandolfo: Discurso do Santo Padre aos prelados da Conferência Episcopal Brasileira (Regiões Oeste 1 e 2), no Palácio Apostólico de Castel Gandolfo, por ocasião de sua visita ad limina apostolorum, realizado no último dia 07.09.09.
Queridos Irmãos no Episcopado,
Com sentimentos de íntima alegria e amizade, acolho e saúdo a todos e cada um de vós, amados Pastores dos Regionais Oeste 1 e 2 no âmbito da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Com o vosso grupo, abre-se a longa peregrinação dos membros desta Conferência Episcopal em visita ad limina Apostolorum, que me dará ocasião de conhecer melhor a realidade das respectivas comunidades diocesanas. Serão jornadas de partilha fraterna para refletirmos juntos sobre as questões que vos preocupam.
Um momento profundamente esperado desde aqueles inesquecíveis dias de maio de dois mil e sete, em que durante a minha visita ao vosso país pude experimentar todo o carinho do povo brasileiro pelo Sucessor de Pedro e, de modo especial, quando tive a possibilidade de abraçar com o olhar todo episcopado desta grande nação no encontro na catedral da Sé, em São Paulo.
Com efeito, só o coração grande de Deus pode conhecer, guardar e reger a multidão de filhos e filhas que Ele mesmo gerou na vastidão imensa do Brasil. Ao longo dos nossos colóquios destes dias, emergiam alguns desafios e problemas que enfrentais, como o Arcebispo de Campo Grande referia ao início deste nosso encontro.
Impressionam as distâncias que vós mesmos, juntamente com vossos sacerdotes e demais agentes missionários, tendes de percorrer para servir e animar pastoralmente os respectivos fiéis, muitos deles a braços com problemas próprios duma urbanização relativamente recente onde o Estado nem sempre consegue ser um instrumento de promoção da justiça e do bem comum. Não vos desanimeis! Lembrai-vos que o anúncio do Evangelho e a adesão aos valores cristãos, como afirmei recentemente na Encíclica Caritas in Veritate «é um elemento útil e mesmo indispensável para a construção duma boa sociedade e dum verdadeiro desenvolvimento humano integral» (n. 4).
Obrigado, Senhor Dom Vitório, pelas amáveis palavras e devotados sentimentos que me dirigiu em nome de todos e que me apraz retribuir com votos de paz e prosperidade para o povo brasileiro neste significativo dia da sua Festa Nacional.
Como Sucessor de Pedro e Pastor universal, posso assegurar-vos que o meu coração vive dia a dia as vossas inquietudes e canseiras apostólicas, não cessando de lembrar junto de Deus os desafios que enfrentais no crescimento das vossas comunidades diocesanas. Em nossos dias, e concretamente no Brasil, os trabalhadores na Messe do Senhor continuam a ser poucos para a colheita que é grande (cf. Mt 9, 36-37). Não obstante a carência sentida, é verdadeiramente essencial uma adequada formação daqueles que são chamados a servir o Povo de Deus. Por essa razão, no âmbito do Ano Sacerdotal em curso, permiti que me detenha hoje a refletir convosco, amados Bispos do Oeste brasileiro, sobre a solicitude qualificativa do vosso ministério episcopal que é a geração de novos pastores.
Embora seja Deus o único capaz de semear no coração humano a chamada para o serviço pastoral do seu povo, todos os membros da Igreja deveriam interrogar-se sobre a urgência íntima e o real empenho com que sentem e vivem esta causa. Um dia, quando alguns dos discípulos temporizavam observando que faltavam «ainda quatro meses» para a colheita, Jesus rebateu: «Pois eu vos digo: Levantai os olhos e vede os campos, como estão dourados, prontos para a colheita» (Jo 4, 35). Deus não vê como o homem! A pressa do bom Deus é ditada pelo seu desejo de que «todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade» (1 Tm 2,4).
Há tantos que parecem querer consumir a vida toda em um minuto, outros que vagueiam no tédio e na inércia, ou abandonam-se a violências de todo gênero. No fundo, não passam de vidas desesperadas à procura da esperança, como o demonstra uma difusa embora às vezes confusa exigência de espiritualidade, uma renovada busca de pontos de referência para retomar a estrada da vida.
Prezados Irmãos, nos decênios sucessivos ao Concílio Vaticano II, alguns interpretaram a abertura ao mundo, não como uma exigência do ardor missionário do Coração de Cristo, mas como uma passagem à secularização, vislumbrando nesta alguns valores de grande densidade cristã como igualdade, liberdade, solidariedade, mostrando-se disponíveis a fazer concessões e descobrir campos de cooperação. Assistiu-se assim a intervenções de alguns responsáveis eclesiais em debates éticos, correspondendo às expectativas da opinião pública, mas deixou-se de falar de certas verdades fundamentais da fé, como do pecado, da graça, da vida teologal e dos novíssimos.
Insensivelmente caiu-se na autossecularização de muitas comunidades eclesiais; estas, esperando agradar aos que não vinham, viram partir, defraudados e desiludidos, muitos daqueles que tinham: os nossos contemporâneos, quando vêm ter conosco, querem ver aquilo que não vêem em parte alguma, ou seja, a alegria e a esperança que brotam do fato de estarmos com o Senhor ressuscitado.
Atualmente há uma nova geração já nascida neste ambiente eclesial secularizado que, em vez de registrar abertura e consensos, vê na sociedade o fosso das diferenças e contraposições ao Magistério da Igreja, sobretudo em campo ético, alargar-se cada vez mais. Neste deserto de Deus, a nova geração sente uma grande sede de transcendência.
São os jovens desta nova geração que batem hoje à porta do Seminário e que necessitam encontrar formadores que sejam verdadeiros homens de Deus, sacerdotes totalmente dedicados à formação, que testemunhem o dom de si à Igreja, através do celibato e da vida austera, segundo o modelo do Cristo Bom Pastor. Assim esses jovens aprenderão a ser sensíveis ao encontro com o Senhor, na participação diária da Eucaristia, amando o silêncio e a oração, procurando, em primeiro lugar, a glória de Deus e a salvação das almas.
Amados Irmãos, como sabeis, é tarefa do Bispo estabelecer os critérios essenciais para a formação dos seminaristas e dos presbíteros na fidelidade às normas universais da Igreja: neste espírito devem ser desenvolvidas as reflexões sobre este tema, objeto da assembléia plenária da vossa Conferência Episcopal, em abril passado.
Certo de poder contar com o vosso zelo no tocante à formação sacerdotal, convido todos Bispos, seus sacerdotes e seminaristas a reproduzirem na vida a caridade de Cristo Sacerdote e Bom Pastor, como fez o Santo Cura d'Ars. E, como ele, tomem por modelo e proteção da própria vocação a Virgem Mãe, que correspondeu de um modo único ao chamado de Deus, concebendo no seu coração e na sua carne o Verbo feito homem para doá-lo à humanidade. Às vossas dioceses, com uma cordial saudação e a certeza da minha oração, levai uma paterna Bênção Apostólica.
[Tradução distribuída pela Santa Sé.
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