Fato extraordinário que nos mostra o poder Divino do Nome de Jesus
A Peste em Lisboa
Ninguém melhor que Frei Luís de Sousa, admirável clássico, o pode relatar:
“Reinando em Portugal o valoroso restaurador do Reino e da liberdade Dom João I, foi Deus servido castigar a terra com uma corrupção pestilencial do ar, que sendo cruel matadora por todo o Reino, em Lisboa e seus termos fez crudelíssimo estrago. Acudia o povo desta cidade a Deus amiudando orações particulares, e gerais: e as que mais continuava, eram em Procissões de quase cada dia a Nossa Senhora da Escada, da Ermida… Com a ocasião de povo junto em lugar tão vizinho, mandavam os Prelados que houvesse pregação na Igreja de São Domingos de Lisboa todas as vezes que vinham, para dar ânimo aos afligidos, e se aliviar a tribulação que era mui crescida.
Dom Frei André Dias, Bispo Dominicano
Continuava, quase sempre, a pregar nestes dias, Dom Frei André Dias. Compadecido das calamidades, que via em seus naturais, trabalhava por se avantajar a si mesmo; e como pregador de espírito apostólico, ainda que de sua colheita, tinha de ser agradável aos seus ouvidos com a música da linguagem, e partes de eloquência, empregava todo o seu estudo em buscar meios para levantar as almas desmaiadas, e caídas com o peso da tribulação, a se armarem cristãmente contra ela com as armas de paciência, e amor de Deus, e esperança firme nEle: afirmando que esta era verdadeira cura.
Consolação e Esperança
Aqui lhes descobria altos tesouros de consolação, mostrando como este Senhor, daquele trono, que para salvar o mundo enfermo escolhera, nele estava dando exemplo, e lições de sofrimento, de caridade, e confiança, para que não houvesse nenhum homem tão afligido, que com tal espelho diante dos olhos não cobrasse ânimo, e alívio, e boa esperança. Logo exortava, com razões saídas da alma, que se queriam ver fim ao mal, todo o homem se empregasse de coração a ser devoto do Nome Sacratíssimo do Bom Jesus, que era coisa certa, e por certo o afirmava, que um Senhor, que tão atribulado fora por valer a homens, quando lhe não mereciam nada, se doeria, e haveria misericórdia dos que via atribulados, que remidos já com Seu Sangue, todavia faziam por Lhe merecer alguma coisa.
Outras vezes, não saindo do mesmo conceito, persuadia que todo o homem trouxesse o Santo Nome continuamente não só na alma e na boca: mas que o trouxesse escrito sobre o peito, e o mandassem pintar sobre as portas das casas, que, sem dúvida, seria remédio poderoso para o Senhor amansar Sua ira.
Acendia-se a gente afligida em amor do afligido Jesus, e no meio das mortes aceleradas, caindo aqui uns, ali outros, andava, todavia, o sagrado Nome nas bocas de todos, louvavam-nO e davam-Lhe graças os que ficavam, escrevam-nO, pintavam-nO.
Fundação da Confraria do Santíssimo Nome de Jesus
Quando o pregador viu, e entendeu tão boa disposição, encheu-se de confiança, que não podia o Senhor faltar com Sua misericórdia; e propôs em um sermão, que se ordenasse uma Confraria, e que fosse o título o Nome de Jesus, afirmando constantemente que o Benditíssimo Jesus, que é fonte de piedade, usaria dela com todos os que folgassem de ser seus irmãos, e confrades e, por meio deles, com toda a terra; que olhassem, que só nisto estava chegar o remédio de tantas calamidades, e tanta desventura, como cada um via em sua casa. Dizia isto e repetia-o com grande eficácia, e já era pedida de muitos a Confraria, e desejada de todos: mas, ou fosse porque nas coisas boas nunca faltam impedimentos, ou porque as muitas mortes tiravam o juízo, e o conselho, não acabava de haver solução.
Morrem milhares e milhares de pessoas!
Entretanto, crescia o dano do contágio com fúria terrível; não havia casa, nem homem seguro; mais fero, e mais pernicioso contra os mais robustos, era tiro de fogo, que apontava, e derrubava, feria e matava tudo junto. Mas o que não tinha reparo, e que só com o medo tirava vidas, era que o ar corrupto e venenoso, depois de enterrar um, e muitos, não se enterrava nem acabava com eles; vivo e inteiro ficava em qualquer peça de vestido e em qualquer dobra de pano, por pequena que fosse; dali, como de emboscada acometia de novo a quem se atrevia a tocá-lo, e com a mesma violência o matava, que fizeram ao que já estava tornada em cinza.
Fazendo isto grande força o bispo para bradar, e rogar, e insistir, enfim foi Deus sérvio, que se veio a assentar, e fundar a Confraria, dia assinalado, véspera da Apresentação de Nossa Senhora, 20 de Novembro do ano do Senhor de 1432. Era domingo, e pregava o mesmo bispo, declarou, do púlpito o que estava assentado, e advertiu juntamente, que acabada a Missa havia de benzer água em Nome do Bom Jesus, Autor e Senhor da Confraria, para que a levassem para casa, e a comunicassem aos enfermos. Foi recebida a nova com extraordinário alvoroço e alegria, com bem estreado prognóstico do que logo sucedeu; e não havia homem, que quisesse ficar fora da Irmandade, nem sair da igreja sem sua parte de água.
Assim esperavam todos, até que, acabada a Missa, saiu o Bispo vestido em Pontifical, e subiu ao altar de Jesus. Era o povo tanto, que não cabia na igreja. Estava posta abaixo dos degraus uma grande talha de água. Benzeu-a com as bênçãos costumadas da Igreja, com muita solenidade, e devoção da sua parte, e infinitas lágrimas dos assistentes, porque nenhum havia em tamanha multidão, que não tivesse ou esperasse em sua casa ocasião delas: e é coisa averiguada, que muitos estavam feridos depois de entrarem na igreja, pelo muito que se reforça, e aviva em qualquer ajuntamento o fogo do contágio. Carregou logo tanta gente, para participar da água benta, que, sem se poderem valer os dianteiros, pela pressa e aperto que faziam os que ficavam detrás, foi a talha derribada, e a água derramada. Mas não se perdeu, antes foi ocasião o derramar-se de chegar aos mais afastados, e tocando todos as mãos e os lenços nela, soube-se com certeza, que logo dos feridos, que eram presentes, sararam muitos; e dos ausentes, a quem se levou, um grande número.
Não havia tantas maravilhas de cem anos atrás
O que foi ocasião de o bispo benzer outras mais vezes, porque era buscada de toda a cidade como único antídoto contra o mal, e com efeitos tão certos em qualidade, que afirma o bispo por letra sua em um livro daquele tempo, que se guarda na Confraria, que não eram acontecidas em toda a Cristandade junta de cem anos atrás, tantas maravilhas. Encarecimento que só a tão santo varão se pode crer. Mas para que em nenhum tempo possa haver dúvida, nem dos milagres, nem do encarecimento, cresceram eles de maneira que, dentro de quarenta dias, contados daquele domingo em diante, se viu o mal de todo acabado: e no fim de Dezembro eram já entradas na cidade muitas famílias inteiras de gente nobre, que na força do trabalho se tinham retirado a suas quintas; e agora acudiam tanto às novas da saúde, como do novo, e santo remédio dela” (Excerto de Frei Luís de Sousa, “História de São Domingos”)
Jesus creio em Vós
Passada a tormenta, não passou com ela a devoção, antes pelo contrário, tomou novo incremento, alimentada pela gratidão e pelo amor. Não houve cidade, nem vila nem púlpito, onde não fossem celebrados a eficácia e poder deste Nome divino. Esta devoção do Nome de Jesus punha, como por encanto, em todas as almas uma viva fé na Bondade infinita do Salvador. Era de ver como os homens de todas as classes, os sábios, os ignorantes, os ricos, os pobres, clamavam com fé a Jesus em todas as necessidades. Esta fé e confiança na proteção de Jesus estava tão enraizada os corações de toda a gente que logo nos perigos e males que vinham nas dores e doenças, instintivamente se chamava por Jesus. Repetiam com tanta fé e confiança este Nome adorável que Deus nada recusava às suas orações.
Nas Igrejas erigiam-se altares e fundavam-se confrarias, e faziam-se procissões para honrar o Nome de Jesus.
A devoção era tão fácil e dava tanto conforto aos corações mais aflitos, tanta força e coragem aos mais tímidos, que ninguém havia que a não praticasse.
O Nome de Jesus foi varinha de condão que de tal forma mudou os corações que em acontecendo a menor desgraça, logo se exclamava: – Ai Jesus! – Caía um cavalo, perdia-se uma ovelha, alguém tinha um súbito contratempo, logo acudia aos lábios a mesma exclamação: Jesus! Traziam consigo cartões com o Nome de Jesus.
Dias Felizes
Notou-se logo, paralelamente, notável transformação nos costumes, com religião mais sólida e mais convicta, verificando-se extraordinário renovação de caráter.
Teve então Portugal dias felizes. Esta devoção durou séculos e, enquanto ela viveu, também na terra portuguesa viveu a prosperidade e a felicidade: a bênção de Deus pairava sobre a nossa terra.
Passou de Portugal para a Espanha onde foi recebida com igual amor e entusiasmo. Frei Diogo da Vitória pregou-a e explicou-a de tal forma que se estabeleceu em todas as partes da Península.
Daí passou para outros países, produzindo aí os mesmos gloriosos resultados.
Fonte: Livro Santíssimo Nome de Jesus - Lisboa Portugal - Pe. Paulo O’Sullivan, irlandês e dominicano.