PADRE GABRIELE AMORTH
Famoso Exorcista da diocese de Roma.
O Exorcismo na França
Desde os primeiros anos do meu ministério de exorcista, sempre me admirei com o grande número de franceses que vinham para a Itália em busca de ajuda de um exorcista. Tive também a oportunidade de conhecer dois exorcistas franceses muito competentes, com os quais troquei experiências e ainda mantenho contato. Por eles, e por outros, prezados amigos dessa nação, recebi as informações que descreverei e que são particularmente importantes pela validade que têm ainda hoje.
Talvez a Franca seja a única nação católica na qual os exorcistas se reúnem todos os anos em assembléia, num congresso de atualização promovido pela própria Conferência Episcopal, desde 1977. De início, participavam cerca de quinze pessoas; atualmente, superam oito dezenas. Um fato bonito, em si, no entanto “nem tudo o que reluz é ouro”.
Nos primeiros tempos, os encontros eram muito proveitosos e, mesmo na diferença de opiniões, satisfaziam os participantes. Tanto o secretário, padre Chenesseau, como também o exorcista Paris, padre Gesland, eram muito ativos na administração do sacramental e procuravam infundir confiança aos novos exorcistas.
A partir de 1984, as coisas mudaram radicalmente. Em Paris, o exorcista padre Gesland foi substituído pelo padre Gauthier, uma pessoa que nunca tinha feito exorcismos e que só acreditava na psiquiatria. Para a secretaria, foi nomeado o padre Isidoro Froc, exorcista de Rennes, conhecido pelo ministério pastoral que desenvolvia num hospital psiquiátrico.
O novo secretário passou a ter uma influência fundamental sobre a assembléia e sobre a formação dos novos exorcistas. Além de nunca ter feito exorcismos, era deplorável, e ainda é, no plano de suas exegeses evangélicas. Com efeito, segue as idéias do padre Emile Morin, que em 1984, escrevia que, na época de Cristo, se colocavam no mesmo plano as doenças, o pecado e o demônio; Jesus adaptou-se a mentalidade dos Seus contemporâneos, por isso, os Evangelhos descrevem nos fatos segundo a sensibilidade cultural do tempo.
É inútil dizer que, com estes critérios debulhados ao máximo, acaba-se por renegar a historicidade dos Evangelhos, reduzida a “linguagem cultural da época”.
O padre Froc preocupou-se muito com os novos exorcistas, instruindo-os para que nenhum deles fizesse exorcismos. Por exemplo, na Bretanha não se encontra ninguém que faça exorcismos, a não ser o padre Jean, monge cistercense de Tiamdeuc, possuidor de grande autoridade e, por isso, capaz de se opor ao padre Froc; quando procurei informações sobre este monge, que recebe seis pessoas por dia, soube que já tinha encontros marcados para os três meses que se seguiam e uma enorme lista de espera.
São poucos os exorcistas franceses que fazem exorcismo; os outros, mais de setenta, seguem as idéias do padre Froc, que tem a plena confiança dos bispos, e é sempre escolhido para falar na televisão, onde declara abertamente que nunca fez exorcismos.
Eu mesmo já falei muitas vezes na televisão italiana, na francesa e nas de várias outras nações; mas expressei bem outras convicções sobre este tema, uma vez que já fiz mais de trinta mil exorcismos. E, no entanto, sigo apenas e somente as Sagradas Escrituras e as leis eclesiásticas.
Mas a situação não para por aqui. Nas assembléias dos exorcistas franceses, quem apresenta conferências são prevalentemente psiquiatras e psicólogos. Com efeito, qualquer problema apresentado é avaliado pelo ponto de vista psicológico, psiquiátrico e sociológico. Em vão se poderia procurar a citação de um exorcista levado ao fim, com sucesso, ou um ensinamento sobre os métodos a serem seguidos na administração dos exorcismos.
Tive casos de pessoas que me foram enviadas por psiquiatras. Exatamente o contrário daquilo que fazem o padre Froc e seus adeptos, apenas preocupados em mandar as pessoas aos psiquiatras. Acrescento outro fato significativo: nas assembléias dos exorcistas franceses, os psiquiatras e os psicólogos falam e ditam a lei. Mas na Itália não é assim.
No dia 26 de abril de 1993 fui convidado a apresentar uma conferência a cerca de quarenta psiquiatras. O tema que me foi pedido era o seguinte: “Como se distinguem os malefícios das doenças psíquicas”. O encontro foi interessantíssimo, sobretudo, pelo debate que se seguiu. Confesso que encontrei naqueles especialistas, muitos dos quais descrédulos, interesse e crédito superiores aos encontrados quando falo a grupos de sacerdotes. Num dos capítulos que se seguem, apresento a conferência que fiz aos psiquiatras.
Mas voltemos ao tema. O leitor poderá pensar que exagerei um pouco no que disse sobre a situação francesa. Pois bem, saiu um livro do padre Isidoro Froc intitulado Esorcisti, chi sono e cosa fanno (Exorcistas, quem são e o que fazem) (Ed. Piemme) que nada ensina sobre os exorcismos. É apenas um espelho fiel das idéias do autor, que tanta influência tem sobre os exorcistas franceses, e que tem difundido as suas idéias por todos os lados.
Limito-me às principais observações.
1- Nunca se descreve um único exorcismo e nunca se fala de exorcismos; são coisas que não devem ser feitas e que não merecem uma palavra a respeito.
2- Qual é então, a missão de um exorcista? Ei-la: Acolher e ouvir as necessidades do outro (p. 186); acolher e ouvir (p. 135); acolhimento, compaixão, caminho espiritual, oração de libertação (p. 142); convidar a rezar e a ter fé em alguém (p. 159); o objetivo é educar para a fé e oração (p. 170); os exorcistas dedicam-se ao acolhimento, à compaixão, ao aconselhamento, para tal os exorcistas ainda servem (p. 185). Nunca se diz que, na presença de determinadas condições, um exorcista tem a tarefa de fazer exorcismos. No fundo, trata-se apenas de doenças psíquicas!
3- Em compensação não faltam expressões que procuram desacreditar os exorcismos que o próprio Jesus realizou, e põem em dúvida o fundamento escriturístico.
Os exorcismos referidos pelos Evangelhos são considerados concepções da época, fatores culturais (p. 62 e 132). Não foram verdadeiras libertações do poder do demônio, mas apenas narrações feitas em consonância com a mentalidade dos contemporâneos de Jesus (p. 133). Jesus atua em conformidade aos usos e à cultura do seu tempo (p. 135).
Poderia continuar com estas citações que, a meu ver, estão em contraste com a Bíblia e a Tradição, como claramente exprimiu o documento do Vaticano: Fede cristiana e demonologia (Fé cristã e demonologia), de 26 de junho de 1975, onde se evidencia a grande importância das libertações do demônio, levadas a cabo por Jesus Cristo. O contraste é bastante evidente.
Para confirmar as suas convicções, o padre Froc cita a conferência que o padre René Marlé, a seu convite, apresentou aos exorcistas franceses em 1992. O espanto é enorme! Nessa conferência, o diabo não é pessoa, mas uma máscara (p. 120). Satanás não é um ser individual, mas é visto por Jesus de acordo com o costume do seu tempo (p. 120. Se Satanás é visto como personificação do mal universal, pouco importa (p. 121). Na Bíblia, o demônio representa as forças do mal, que induzem à tentação (p. 122). E o próprio padre Froc acrescenta: perante a pergunta sobre a existência ou inexistência do diabo, nem sempre é possível dar uma resposta precisa (p. 132). Todas estas afirmações são condenadas pelo famoso discurso sobre o demônio, pronunciado pelo Papa Paulo VI no dia 15 de novembro de 1972, no qual afirma que quem as apóia “está fora do quadro do ensinamento bíblico e eclesiástico”.
Mas vamos à conclusão.
Infelizmente, as idéias do padre Froc procuram se difundir. No seu livro, procura derrubar o Ritual ainda em vigor, com frases do tipo: o exorcismo é um gesto mágico (p.142 e 159); os três sinais de possessão diabólica indicados pelo Ritual perderam o seu valor para os dias de hoje; o espiritismo é apenas um perigo do ponto de vista psicológico e espiritual (p.76); a magia é um fenômeno cultural (p.77). Por isso, quem erra é a Bíblia e o Catecismo da Igreja Católica, pois condenam a magia! E podíamos continuar.
Em compensação, o autor elegia incondicionalmente o Novo Ritual, como se fosse definitivo, quando é apenas adínterim. O padre Froc teria feito melhor se não fizesse referência a ele: tanto pelo que revelam, infelizmente, as idéias francesas de quem o redigiu, mas sobre tudo porque é um documento ainda reservado, sujeito às observações dos bispos e, portanto, sujeito a alterações.
Existe também uma compensação final para todos os que são pró-exorcistas, que é uma verdadeira obra-prima. O padre Froc reconhece, bondade a sua, que Jesus fez dois exorcismos. O “Amame”, dirigido por três vezes a São Pedro, e que nós, pobres ignorantes, considerávamos um tríplice atestado de amor em reparação da tríplice renegação; é, pelo contrário, um autêntico exorcismo (p.138). Ainda mais assombroso é o beijo de Judas, que nós ignorantes considerávamos a consumação da sua traição, e que em vez disso é um verdadeiro exorcismo, porventura, não muito bem sucedido (p.140).
Sinceramente, fica a dúvida se o padre Froc sabe o que é ser moderno e, como afirma, a obra de um exorcista do século XXI resume-se a “acolher e ouvir” (p.86). Nada mais.
Escrevo estas linhas com amargura, mas também convencido de estar prestando um serviço. O exorcismo está bem fundamentado nas Sagradas Escrituras, em toda a Tradição da Igreja, nas leis eclesiásticas. E, no entanto, também na Itália existem exorcistas que se limitam a acolher e ouvir. É melhor do que nada, é certo, mas não chega. É melhor do que o comportamento daqueles... que mandam para o diabo. Mas, dos exorcistas, espera-se muito mais!
Fonte: Extraído do Livro "Exorcistas e Psiquiatras" - Pe. Gabriele Amorth - Ed. Palavra & Prece.