PADRE GABRIELE AMORTH
Famoso Exorcista da diocese de Roma.
CONCLUSÃO.
Estou no fim do meu livro e parece-me ter dito muito pouco a respeito de tanta coisa que poderia ter dito; mas tive intenção de escrever de uma forma prática os frutos de uma experiência direta, coisa que até agora ainda não encontrei em nenhum livro.
Espero ter prestado um serviço a todos os que se interessam por este tema; tive presente, sobretudo, os padres que deveriam todos ter, pelo menos, aquele conhecimento mínimo que lhes permite discernir, perante casos concretos, quando uma pessoa deve ser mandada para um exorcista, porque há motivos que fazem suspeitar uma presença maléfica ou quando, pelo contrário, é inútil tal recurso. Já disse, mas volto a repetir: é muito importante.
No que se refere à minha experiência pessoal, devo agradecer ao Cardeal Poletti, que me escolheu, sem eu esperar, e me confiou este encargo que aceitei de olhos fechados. Agora vejo, nesta possibilidade que me foi concedida, sem nenhum mérito da minha parte, um complemento do meu sacerdócio: conforme celebro Missa, prego o Evangelho, confesso, quando é necessário faço exorcismos. Tenho a possibilidade de ajudar tantas pessoas que sofrem para quem, por vezes, uma palavra de compreensão é o suficiente. Só me sentiria meio padre se não tivesse esta possibilidade que, embora sendo de uso excepcional, comparada com as outras práticas do ministério sacerdotal, faz parte da pastoral eclesiástica normal. Pelo menos assim deveria ser.
Posso igualmente dizer que tirei imensas vantagens sob o ponto de vista espiritual. Vantagens para a fé porque se toca o mundo invisível com a mão; vantagens para a vida de oração e para a humildade porque constatamos constantemente a nossa absoluta impotência face a estes males: embora procurando rezar com fé e empenho, não passamos de “servos inúteis”, e se não é o Senhor a intervir e a fazer tudo, o resultado dos nossos esforços e dos nossos conhecimentos adquiridos com a experiência é zero. Quando digo que é zero, não exagero de fato; São Paulo diria que é “Deus quem faz crescer” (1Cor 3,6).
Desejaria também desmentir uma crença, que não sei porquê se infiltrou no seio de uma boa parte do clero: a idéia de que o demônio se vingaria dos exorcistas. O meu mestre, o Pe. Cândido, que exerceu esta função a tempo inteiro durante trinta e seis anos, sofreu diversos problemas de saúde mas, na maioria das vezes devidos à sua idade e não à ação do demônio.
O D. Pellegrino Ernetti, de Veneza, exorciza há trinta e três anos e este ministério não melhorou nem piorou a sua saúde. Volto a dizer e rezarei para que me acreditem: o demônio já faz a cada um de nós todo o mal que pode. É falso pensar: se eu o deixar em paz ele também me deixa em paz. É falso, e é uma traição à nossa missão sacerdotal, que está toda empenhada em conduzir as almas para Deus, subtraindo-as, quando necessário, ao poder de Satanás: por meio, em primeiro lugar da Evangelização que é sem dúvida de importância capital, por meio dos sacramentos e por fim dos sacramentais entre os quais figura também o exorcismo. Um padre que tem medo das represálias do demônio é como um pastor que tem medo do lobo. E esse temor é totalmente injustificado.
Seria estúpido sobre valorizar certas vinganças que o Diabo faz para desencorajar os exorcistas. Trata-se de casos raros e vou contar um exemplo.
Um dia, um sacerdote ajudava o Pe. Cândido. Estava a exorcizar um jovem quando, de repente, as roupas deste se incendiaram. Nada de grave, só uma ligeira queimadura no ombro. A mãe disse aos padres que até a roupa interior do filho tinha ficado queimada, mas sem incomodo para o filho. Um cheiro acre de enxofre desprendeu-se enquanto queimava, e o demônio, virou-se para o padre auxiliar, dizendo-lhe que lhe pagaria carro.
Alguns dias depois esse padre, de noite, voltava de carro de Nápoles para Roma. De repente, na estrada foi ofuscado por luzes laterais de que ele não sabia a proveniência. Decidiu por isso parar numa estação de serviço; quando estava quase a chegar, o carro incendiou-se. O padre só teve tempo de parar, tirar as chaves e afastar-se. Acorreram alguns automobilistas que gritavam: “Há alguém lá dentro! Vê-se lá alguém!”. O padre tentou convencê-lo em vão que era só ele. De repente, o carro destravou-se sozinho e começou a avançar lentamente, como uma bola de fogo em direção às bombas de gasolina. Simultaneamente espalhou-se na zona um cheiro acre de enxofre; o padre reconheceu que era o mesmo cheiro que se tinha desprendido durante o exorcismo e começou a rezar. O carro parou imediatamente mas continuou a arder, até que ficou totalmente destruído.
Contei este episódio por amor à exatidão, mas seria um erro generalizar a importância; tratou-se de um caso excepcional. Todos os padres sabem perfeitamente que, mesmo se não são exorcistas, pelo seu magistério sacerdotal se expõem a riscos e a aborrecimentos. S. Pedro dizia: “Alegrai-vos em ser participantes dos sofrimentos de Cristo, para que vos possais alegrar e exultar no dia em que for manifestada a Sua Glória” (1 Pd 4,13). A salvação das almas merece bem alguns sacrifícios.
O padre deve acreditar no seu sacerdócio, deve acreditar no poder que o Senhor lhe deu. Deve seguir o exemplo dos apóstolos e todos os sacerdotes santos. João XXIII lembrou a todos no início do seu pontificado a figura do Cura D’Ars. É verdade que este santo arrancava as almas a Satanás e sofreu tanto por causa do demônio. Não era exorcista e não fazia exorcismos. É o Senhor quem governa e não nos dá provas sem nos dar ao mesmo tempo a força para as superar. Mal de nós se, por desleixo, nos furtamos e omitimos o nosso dever.
Temos o dom do Espírito, a Eucaristia, a Palavra de Deus, a força do nome de Jesus, a proteção da Virgem, a intercessão dos Anjos e dos Santos... Porque é que havíamos de ter medo de um vencido?
Peço à Virgem Imaculada, inimiga de Satanás e vitoriosa sobre ele desde o primeiro anúncio da Redenção, que nos ilumine a todos, que nos proteja, que nos sustenha no combate terrestre até a obtenção do prêmio eterno. Peço-lhe, particularmente, por todo o episcopado católico, que tem a obrigação de se ocupar de todos os que sofrem por causa do demônio, para que proceda conforme com as leis e a tradição da Igreja.
Virgem Imaculada! É uma alegria terminar pensando naquela cuja inimizade para com o demônio foi querida pelo próprio Deus: “Porei inimizade entre ti e a mulher” (Gn 3,15). É Imaculada porque não foi atingida pelo pecado original nem cometeu faltas atuais, isto é, nunca cedeu a Satanás. É sempre virgem porque pertenceu sempre a Deus, incluindo o seu corpo donde o Verbo tirou o seu próprio corpo.
Pensemos no valor da Encarnação: o demônio que não tem corpo porque é só espírito, na sua soberba queria ficar no centro de todas as coisas criadas; depois da Encarnação foi obrigado a ver que, pelo contrário, é Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, que é o centro da criação; e é obrigado a constatar que, com a Encarnação, começa o tempo da sua derrota.
É por isso que ele procura por todos os meios fazer que o corpo humano se torne ocasião de pecado, procura humilhar o corpo, manchá-lo, como reação raivosa à Encarnação do Verbo, que com o Seu corpo sacrificado por nós, nos redimiu. Daí a importância deste dogma mariano, Maria sempre Virgem em oposição a Satanás, e como instrumento dos planos de Deus.
Maria declarou-se a serva do Senhor e tornou-se a Mãe de Deus, adquirindo uma intimidade completamente única com a Santíssima Trindade. Em que oposição se encontra Satanás que se afastou de Deus, e se tornou assim a criatura mais distante.
Maria na sua Assunção ao Céu revela a gloriosa conclusão do plano de Deus que nos criou para sermos eternamente felizes com Ele; e revela a total frustração de Satanás precipitado da alegria celeste para o suplício eterno.
Maria, nossa Mãe, Mãe da Igreja, Mediadora Universal das Graças, mostra-nos pelo seu dinamismo contínuo a obra da Virgem a quem Cristo desejou associar a Si na santificação das almas. E revela a sua oposição radical a toda a obra de Satanás, que tende a opor-se à atuação dos planos de Deus sobre os homens, pelo que nos persegue tenta por todos os meios e, não contente por estar na raiz do mal, do pecado, da dor, da morte, procura ainda arrastar-nos para a condenação eterna.
Termino com estes pensamentos apenas delineados. Depois de ter escrito quatro livros sobre a Santa Virgem, não quero escrever o quinto agora, quando está na altura de concluir. O escritor Manzoni adverte-nos, com o seu bom senso, que basta um livro de cada vez, quando não é já demasiado.
Fonte: Extraído do Livro "Um Exorcista Conta-nos" - Pe. Gabriele Amorth - Ed. Paulinas.