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A Oração do Coração!

 

Existem momentos na vida em que a alma encontra alívio apenas na oração profunda. Queira Deus que, em momentos assim, as almas possam perseverar na oração, isso é muito importante. (Diário de Santa Faustina N° 860).

 

Durante a Hora Santa, o Senhor concedeu-me participar da Sua Paixão. Dividi com Ele a amargura da dor de que estava repleta a Sua alma. Jesus deu-me a conhecer como a alma deve ser fiel à oração, apesar dos tormentos, da aridez e das tentações, porque em grande parte e principalmente de uma oração assim depende, às vezes, a concretização de grandes desígnios de Deus. E, se não perseveramos nessa oração, transtornamos o que Deus queria realizar através de nós, ou em nós. Que toda alma se lembre destas palavras: “E, estando em agonia, rezou mais longamente”. Eu sempre prolongo uma oração assim, na medida das minhas possibilidades e de acordo com os meus deveres. (Diário de Santa Faustina N° 872).

 

Muitos rezam o Terço, ou o Ofício Divino, ou outras devoções externas e, contudo, vivem em pecado mortal. Dedicando-se, porém, a esta oração, é impossível perseverar no pecado.

 

Santo Afonso Maria de Ligório.

 

O divino Salvador não precisava buscar um lugar solitário para se entregar à oração, como nota Santo Ambrósio, pois, como sua bendita alma gozava sempre da união de seu Pai celestial, pensava nele em todos os lugares e em todas as circunstâncias e suplicava continuamente por nós. Apesar disso — como narra São Mateus (Mt 14,23) — despedia ele o povo e subia ao monte para rezar na solidão. Fazia isso para nos persuadir da necessidade da oração mental ou meditação. Quem quiser operar seriamente a sua salvação, não deve deixar de forma alguma a oração mental.

 

1. A alma que não faz oração mental está primariamente privada de luz. Quem conserva os olhos fechados — diz Santo Agostinho — não poderá ver o caminho que conduz à pátria. As verdades eternas são coisas completamente espirituais, não podem ser vistas com os olhos do corpo, mas unicamente com os olhos do espírito, isto é, podem ser apreendidas só pela reflexão e meditação. Aqueles, pois, que não praticam a oração mental, não veem essas verdades e, consequentemente, não conhecem a importância de sua salvação eterna e os meios a empregar para assegurá-la.

 

A perdição de muitas almas provém unicamente da falta de reflexão das verdades eternas e do caminho que conduz ao céu. “Toda a terra está cheia de desolação porque não há ninguém que considere em seu coração” (Jer 12,11). Ao contrário, nos assegura o Senhor que quem tem as verdades da fé diante dos olhos, principalmente as da morte, do juízo e da feliz ou desgraçada eternidade que nos espera, nunca cometerá um pecado. Recorda-te de teus novíssimos e jamais pecarás(Eclo 7,40). Por isso, o divino Salvador nos admoesta que tenhamos sempre nas mãos nossas lâmpadas acesas: “Estejam cingidos os vossos rins e lâmpadas acesas nas vossas mãos” (Lc 12,35). Essas lâmpadas — diz São Boaventura — são as meditações piedosas, pois, na oração mental, o Senhor fala conosco e nos ilumina. “Vossa palavra é uma luz para meus pés” (Sl 118,105).

 

São Bernardo compara a meditação com um espelho, e com toda a razão: quando se tem uma mancha no rosto e se coloca diante de um espelho, vê-se a mancha e tira-se; quando, porém, não se olha para o espelho, fica a mancha no rosto, porque, como não se vê, não se pensa em removê-la. O mesmo se dá com a oração mental: quando se tem um defeito ou se encontra em uma ocasião perigosa e se vai à meditação como a um espelho, descobre-se imediatamente a falta que se tem, bem como a ocasião em que se acha, e, vendo-as, removem-se.

 

Santa Teresa escreveu ao bispo de Osma: “Ainda que nos pareça que não temos imperfeição alguma, contudo, descobrimos um grande número delas quando Deus nos abre os olhos da alma, como costuma fazê-lo na meditação” (Carta 8). Quem não medita — diz São Bernardo — dificilmente descobrirá suas faltas e, por conseguinte, não terá aversão a elas. Um tal não conhece igualmente os perigos a que está exposto a respeito de sua salvação e, por isso, não pensa também em precaver-se contra os mesmos. Mas aquele que se dá à meditação, conhecerá logo suas faltas e os perigos a que está exposto e, por esse conhecimento, será levado à aplicação dos meios necessários.

 

Pela meditação se excitava Davi ao exercício da virtude e à emenda de vida: “Pensei nos dias antigos e tive na mente os anos eternos e meditei de noite no meu coração, e me exercitava e purificava o meu espírito” (Sl 76,67). Nos Cânticos assim se exprime o divino Esposo: “As flores apareceram na nossa terra; o tempo da poda já chegou; ouviu-se na nossa terra a voz da rola” (Ct 2,12). Quando a alma, qual pomba solitária, se afasta do tumulto do mundo para falar com Deus na oração, então aparecem as flores, isto é, os bons desejos; e é o tempo da poda, quer dizer, tempo de se purificar das faltas descobertas na oração. “Pondera que o tempo de podar já chegou — diz São Bernardo (De Consid., l. 1, c. 7) — quando bater a hora da meditação, pois ela ordena as nossas inclinações, dá a justa direção às nossas ações e nos corrige de nossas faltas”.

 

2. Sem oração mental não temos, em segundo lugar, a força necessária para resistir aos ataques de nossos inimigos e para praticar as virtudes cristãs. A meditação produz em nossas almas o mesmo efeito que o fogo sobre o ferro: estando o ferro frio, é duro, e não se deixa trabalhar; sendo posto ao fogo, torna-se mole e se sujeita à vontade do ferreiro; por isso é ele incandescido antes de ser trabalhado. “Só o ferro incandescido é que o ferreiro procura manejar com repetidas pancadas” — diz o venerável Bartolomeu dos Mártires.

 

Para guardar os mandamentos e conselhos de Deus deve-se ter um coração mole, isto é, dócil, que facilmente receba as impressões e inspirações divinas e imediatamente se dirija conforme elas. Salomão pedia ao Senhor tal coração, dizendo: “Senhor, dai ao vosso servo um coração dócil” (1Rs 3,9). Em consequência do pecado, nosso coração atualmente é duro e indócil por natureza: inteiramente inclinado aos gozos sensuais, resiste à lei do espírito, por cuja causa lamentava o Apóstolo: “Vejo outra lei em meus membros, que resiste à lei de meu espírito” (Rm 7,23).

 

Contudo, sob a influência da graça que recebemos na meditação, tornamo-nos moles e dóceis: na consideração da bondade, do grande amor que Deus nos demonstrou e dos imensos benefícios com que nos cumulou, sentimo-nos inflamados, comovidos, e, por isso, também mais prontos para obedecer à voz do Senhor. Pelo contrário, o coração, sem oração mental, permanece duro, rebelde e desobediente, e perde-se miseravelmente: “O coração duro será oprimido de males, no fim da vida; e quem ama o perigo, perecerá nele” (Eclo 3,27).

 

Por esse motivo exortava São Bernardo ao Papa Eugênio II a que nunca deixasse a oração mental por causa dos trabalhos externos: “Eu temo, meu Eugênio, que deixes a oração e a meditação por causa dos muitos trabalhos e que, assim, teu coração se endureça, porque então não terá mais horror de si mesmo e se tornará insensível” (De Consid., l. 1, c. 2).

 

Muitos consideram como perdido e inútil o tempo considerável que as almas devotas empregam na oração mental, visto que, segundo eles, esse tempo poderia ser muito melhor empregado na prática de boas obras. Não pensam, porém, que a alma adquire na meditação a força para vencer seus inimigos e para praticar a virtude, conforme a sentença de São Bernardo: “Desse ócio provém a força”. Justamente por isso proíbe o Senhor despertar a sua esposa do sono: “Eu vos conjuro, filhas de Jerusalém (…) que não desperteis nem façais levantar-se minha amada até que ela o queira” (Ct 3,5); pois o sono ou o descanso que a alma goza na meditação é de suma necessidade para a vida espiritual.

 

Quem não pode dormir, também não tem força para trabalhar nem para andar, e desfalece necessariamente no caminho. Do mesmo modo, uma alma que deixa de descansar, isto é, de renovar suas forças na oração mental, torna-se incapaz de praticar o bem e de resistir às tentações; ela cai de uma falta em outra.

 

3. Em terceiro lugar, sem a meditação não praticamos como devemos a oração de petição, que é indispensável para a salvação eterna. Se negligenciamos a suplicação, Deus não nos assiste mais; sem a assistência de Deus, porém, não podemos guardar seus mandamentos. Por isso, São Paulo exorta os fiéis a rezar sem interrupção: “Orai sem interrupção” (1Ts 5,17). Nós todos somos uns pobres mendigos, como dizia de si mesmo Davi: “Eu sou um mendigo e pobre” (Sl 39,18). O único recurso dos pobres consiste em pedir esmolas aos ricos.

 

Do mesmo modo, devemos nós empregar esse meio na nossa pobreza espiritual e procurar alcançar de Deus, pela oração, as graças que precisamos. São João Crisóstomo diz: “Sem oração é simplesmente impossível viver virtuosamente” (De orat. Dom., l. 1). Donde provém a grande depravação dos costumes que se vê por toda a parte — pergunta o sábio Bispo Abelly — a não ser do abandono da meditação? Quando não se medita e se vive continuamente nas distrações que consigo trazem os negócios seculares, não se conhecem as próprias necessidades espirituais nem os perigos que ameaçam a alma, nem mesmo a necessidade de rezar que pesa sobre cada homem.

 

Em consequência dessa cegueira, deixa-se a oração de petição, e assim, perde-se infalivelmente. O célebre Bispo Palafox diz, nas suas anotações às cartas de Santa Teresa: “Como poderemos perseverar no amor de Deus, se Deus mesmo não nos der a perseverança? Como, porém, nos concederá o Senhor a perseverança se não Lhe pedimos? Como Lhe pediremos, se não praticamos a oração mental? Sem a oração mental não temos nenhum comércio com Deus e não podemos nos conservar na virtude” (Carta 8). São Roberto Belarmino exprime o mesmo pensamento, dizendo que é moralmente impossível viver isento do pecado se não se pratica a oração mental.

 

Talvez aqui objete alguém: De minha parte eu não faço meditação, mas também não deixo a oração vocal. A isso se deve responder com Santo Agostinho que, para alcançar as graças de que se precisa, não basta rezar só com a boca, mas deve-se rezar também com o coração. As orações vocais muitas vezes são feitas com muitas distrações e só com a voz do corpo e não com a do coração, principalmente quando são muito compridas e recitadas por aqueles que não sabem meditar; por isso, Deus apenas as ouve e raramente as atende.

 

Muitos rezam o Terço, ou o ofício da Santíssima Virgem, ou outras devoções externas e, contudo, vivem em pecado mortal. Dedicando-se, porém, à meditação, é impossível perseverar no pecado. Um grande servo de Deus dizia: “Oração e pecado não podem estar juntos”. A experiência ensina que aqueles que se consagram à meditação, não caem na desgraça de Deus. E se, por infelicidade, lhes acontecer isso, se não abandonarem a oração mental, entrarão brevemente em si e se converterão a Deus. “Por mais imperfeita que seja uma alma — diz Santa Teresa —, se perseverar na oração mental, o Senhor a conduzirá finalmente ao porto da salvação” (Vida, c. 8).

 

Referências:

 

Trecho do livro Escola de Perfeição Cristã, parte 2, cap. 11, § 1.º, “Necessidade da oração mental para alcançarmos a salvação”. Este livro é uma compilação dos escritos de Santo Afonso feita pelo Pe. Édouard Saint-Omer, CSsR.

 

Fonte: https://padrepauloricardo.org/blog/sem-esta-oracao-estamos-perdidos